Uma Visão do Futuro

Todo ano os moradores de Geroma, um pequeno município nos limites da capital de Fulguras, se juntam para a comemoração do aniversário do local, nesta festividade uma grande feira de eventos é montada na praça central da cidade, com direito à um parque de diversões, circo e barraquinhas de comidas tradicionais. Bruno, um jovem da casa dos trinta anos de idade, aproveita a situação para levar a sua filha, Maria, para curtir as festividades.
"Nossa, acho que o festival está maior que o do ano passado" - constata Maria. "Olha papai, tem até circo!"
"É, tem mesmo" - confirma Bruno. "Você quer ir ao circo?"
"Quero!" - exclama a garotinha dando um salto.
Os dois então partem para a fila dos ingressos. Parece que muita gente teve a mesma ideia. Após alguns minutos de fila, Maria já estava ansiosa: "Ai, papai esse negócio tá muito chato!"
"Calma, filha. Já está chegando a nossa vez" - ressalta o pai.
"Ah, mas ainda tem muita gente na nossa frente. Eu não quero esperar!" - reclama. "Posso dar uma volta enquanto o senhor compra os ingressos?" - pede.
Bruno faz uma cara de poucos amigos.
"Por favoooor...." - suplica Maria.
"Certo, mas fique aonde eu possa te ver" - cede Bruno com um tom emburrado. "E não me vá falar com estranhos!" - ressalta.
"Obrigada, papaizinho!" - se alegra Maria, dando um beijo na bochecha do pai antes de sair. Ela então caminha pela feira, observando as várias barracas em busca de algo que lhe chamasse a atenção, mas o que a intriga é uma mulher diferente: uma pele vermelha de roupas pretas cobertas de penas negras, sua cabeça adornada com uma espécie de turbante formado de tiras finas de madeira, a aura dela não negava, com certeza era uma espécie de feiticeira, uma bruxa! Maria nunca tinha visto nenhum mago de tão perto assim.
"Venha aqui, pequena Joana" - diz a bruxa.
Maria desvia o olhar fazendo uma cara de confusão, ela tenta olhar para os arredores tentando encontrar com quem a feiticeira estava falando, sem sucesso.
"É com você mesmo que estou falando, querida. Venha, não tenha medo" - indaga a bruxa.
Maria faz uma expressão de dúvida e aponta para si mesma enquanto olha para a bruxa que, sem perder tempo, faz um sinal a chamando.
"Acho que a senhora está me confundindo com alguém" - relata Maria enquanto se aproxima da mulher. "Meu nome não é Joana, é Maria" - completa.
"Ah, eu sei, querida. Eu só estava te testando" - responde.
"Me testando trocando o meu nome?" - questiona Maria com uma expressão de estranheza.
"Mas é claro, se você, pequena Maria, tivesse esquecido o seu o próprio nome, seria evidente a sua demência" - explica. "Mas eu, como uma bruxa poderosa e benevolente que sou, estou aqui para provar para o mundo que você ainda mantém suas capacidades mentais. Isso não é maravilhoso? Não sou eu um símbolo de altruísmo e uma inspiração para as gerações futuras?" - inquire.
Maria novamente faz uma cara de interrogação misturada com espanto, indignação e... nem ela mais sabe o que sentir diante de uma situação tão estranha como esta. As duas ficam em silêncio por alguns instantes até que a bruxa volta a falar:
"Mas eu sei o que você está pensando. Você está morta de vontade de saber quem é essa pessoa maravilhosa que lhe dirige a palavra." - afirma.
"Nem tanto..." - fala Maria com desdém.
"Mas eu não posso revelar o meu nome para você ainda, queridinha" - continua a feiticeira falando por cima da declaração de Maria. "Não até que você passe em outro de meus testes"
"Maria!" - grita uma voz masculina que chega pelas costas da garota. Ao olhar para trás, Maria avista o seu pai vindo em sua direção. "Eu não posso deixar você sozinha um minuto que você já fica falando com estranhos" - diz Bruno ao se aproximar da filha. "Ainda mais falando com a Labeha, ela é a mais estranha de todos" - completa, demonstrando que conhece a bruxa.
"Os anos passam mas você não se cansa de estragar minhas performances" - reclama a mulher.
"O senhor conhece ela, papai?" - questiona Maria
"É claro que ele me conhece, e eu o conheço também" - intercede Labeha. "Esse é o motivo de eu saber o seu nome, você não achou que eu estava mentindo sobre isso, achou?" - questiona
"Se o senhor a conhece por que EU também não a conheço, hein?" - questiona Maria
"Não é nada, Labeha é a bruxa que procuro quando preciso de alguma coisa mágica" - explica Bruno. "E a senhorita sabe muito bem que eu não a quero se metendo com magos"
"O que é uma pena. Talvez você também seja uma bruxa" - relata Labeha. "Alguma vez já tentou moldar a realidade com a sua vontade? Conjurar algo?" - questiona.
"Não! Não tentou e nem vai tentar, era só o que me faltava agora" - interrompe Bruno, se posicionando entre Maria e a bruxa.
"Você é, com certeza, muito mente fechada. Abra a sua mente para o universo" - conclui Labeha.
"Não, obrigado. Mas o que você queria com a minha filha?" - questiona Bruno.
"Oh, nada. Não precisa ficar nervosinho. Eu só vi você andando com a garota e concluí que ela era a sua filha" - acalma Labeha. "Não é como se eu estivesse recrutando bruxinhas mirim. Eu não tenho paciência para ensinar ninguém sobre nada"
"É mesmo? Que bom" - replica Bruno. "Foi um prazer te ver aqui, Labeha. Mas nós temos que ir, temos ainda muitas coisas para ver no festival"
"Sério? Foi um prazer? Não está parecendo" - reclama Labeha.
"É, é. Que seja. Tchal, Labeha. Fique com os deuses e se cuide" - se despede Bruno arrastando Maria. Labeha fica para trás acenando com a mão. "E você pode tirar dessa sua cabecinha esta ideia de ser bruxa, viu?" - adverte Bruno se dirigindo à Maria.
"Eu não disse nada!" - exclama Maria.
"É bom mesmo" - ressalta o pai. "Agora vamos, consegui ingressos pro circo" - informa mostrando os bilhetes.
Maria começa a seguir o pai, porém, enquanto caminhava, nota a presença de um gato preto que a olhava fixamente. Ela se perde por alguns instantes no olhar do animal e, antes que perceba, é envolvida em uma visão onde uma grande árvore se ergue em um local desolado, longe de tudo e de todos, mas isso não é tudo, ela percebe que na verdade não está visualizando a árvore, ela é árvore. Ao se dar conta disso Maria desperta da visão, uma sensação de desconforto enorme toma o seu peito, a fazendo cambalear para trás.
"Filha, você não vem?" - chama Bruno.
Ela se recompõe e acena positivamente com a cabeça, tenta localizar o gato, contudo não o encontra, então decide ignorar aquela experiência e seguir o seu caminho. No sentido oposto à ela, o gato preto corre em direção à Labeha e, ao chegar próximo da feiticeira, seu corpo se desfaz em fumaça, restando apenas uma joia negra a qual a bruxa segura na mão e guarda em sua roupa: "Infelizmente, Bruno, meu amigo, ninguém pode escapar do destino" - delibera.
"Olá, dona bruxa! Você pode ler a minha mão?" - questiona uma garota que chega com o seu namorado pelas costas de Labeha.
"Mas o que é? Você acha que eu tenho cara de ter uma bola de cristal aqui comigo?" - responde a bruxa virando apenas o rosto para o casal.
"Ai, nossa! Desculpa, eu nem sabia que você precisa de uma bola de cristal para ler a mão de alguém" - diz a moça desanimada enquanto volta por onde veio.
"Pobre criança, um futuro tão triste a espera. Os deuses podem ser tão cruéis" - lamenta Labeha voltando a olhar para frente. "Ei! Esperem aí!" - corta o raciocínio se voltando para o casal novamente. "Se vocês querem que eu diga o futuro de vocês eu posso fazer isso sem ler a sua mão, eu tenho clarividência afinal" - informa ao casal, que voltam ao seu encontro.
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